
LANÇAMENTO: 13 de Março de 2020
DIREÇÃO: Eliza Hittman
ROTEIRO: Eliza Hittman
ELENCO PRINCIPAL: Sidney Flanigan; Talia Ryder; Théodoro Pellerin...
Um retrato íntimo de duas adolescentes na zona rural da Pensilvânia. Diante de uma gravidez indesejada e da falta de apoio local, Autumn e sua prima Skylar embarcam em uma jornada cheia de travessias até a cidade de Nova York.
Inicialmente, no
1º ato – o mais relevante para uma devida
apresentação de personagem -, o filme nos dá uma perspectiva do ambiente
social de Autumn. Contudo, infelizmente, não traz substratos sobre a personagem
que falem exatamente sobre quem ela é, apenas apresenta algumas atividades
corriqueiras dela e, no fim, acaba não estabelecendo nada de modo palpável para
compreendermos o contexto de vida e sociedade no qual ela está inserida.
Assim sendo, antes de desenvolver e robustecer um roteiro, principalmente sobre o tema aborto – que é complexo e traz grandes debates acalorados -, é salutar que haja um desenvolvimento razoável dos personagens, para que absorvamos os aspectos fáticos que os circundam, construindo alicerces fortes para que a história evolua de modo mais perspicaz e socialmente humano, o que não ocorre no filme. Simplesmente apresenta pequenas cenas para explicitar o jeito introspectivo de Autumn, mas sem abastecer de minúcias que são relevantes para a história que estava iniciando sua jornada.

Nesse sentido, a
diretora Eliza Hittman - especialmente
em razão do roteiro e montagem -, acaba afastando o espectador da
personagem, tornando a relação gélida e distante, apesar de estabelecer a
personalidade dela em pequenas cenas. Ou seja, compreende-se a personalidade da
personagem sem diálogos expositivos - o
que é positivo para a diretora -, mas falha enormemente ao não
contextualizar o entorno dela.
Daí em diante,
particularmente no 2º ato, traz cenas humanamente lindas, e uma em especial – momento em que há perguntas específicas para
Autumn – é de cortar o coração, enaltecendo o talento nato de Sidney
Flanigan, porém com o distanciamento de espectadores mais exigentes, o
que demonstra a existência de uma cena humanamente linda, mas construída sem
alicerces mínimos para corroborar o momento de questionamentos tão intensamente
humanos da personagem.
Ademais, é um
filme que, além de falhar com a personagem principal (Autumn), falha com todos os outros, simplesmente não trazendo background de nenhum deles, o que seria
relevante para que a cena final, por exemplo, fizesse-nos, como espectadores,
realizar um callback de tudo que foi
delineado na trama, podendo transformá-la em um monumento descomunal. Por
esse ângulo, cenas relevantíssimas ocorridas no 2º e 3º atos perdem peso,
inclusive sobre temas como aborto e violência contra a mulher, que
necessitariam de uma construção perspicaz e cuidadosa, pois, da forma que foram
feitas, torna o debate raso e facilmente refutável.
Entretanto,
embora seja um filme repleto de construções falhas, tem seus méritos. Dito
isso, a fotografia e a paleta de cores do filme são muito bem conduzidas,
delineando bem os sentimentos e momentos de confusão mental de Autumn.
Com tons bem escuros de cores, bem como a presença, em determinado momento, de
variação do preto para cores claras, demonstra sentimentos como tristeza,
solidão, questionamento e dificuldade de lidar com as circunstâncias que se
encontra. Além disso, se desconsiderarmos o 1º ato e preenchermos lacunas que o
filme deixa, a experiência pode até melhorar, visto que o filme começa a ganhar
corpo com o crescimento da trama, mas sofre, como já dito diversas vezes acima,
com sua própria frieza e distanciamento.

Outrossim, analisando as
intenções fundamentalistas do filme, percebe-se categoricamente o viés
defendido pela diretora na história ao terminar o filme, o que pode gerar uma
viciada rejeição ou aceitação a ele. Todavia, apesar da controvérsia secular do tema
– aborto, as grandes falhas deste
filme não estão no que a diretora defende, ou não, mas, sim, na construção das
bases para entregar, ao final, um ápice duradouro e estonteante. Assim, como já
exposto, temos um filme relevante no âmago para o debate, mas com alma e
coração imensamente desproporcional ao que se poderia entregar.
Portanto, “Never Rarely Sometimes Always” tem todos os elementos
introdutórios mínimos para ser um filme grandioso e excepcional, mas retrata e
relata um tema de importância tão abissal de modo raso, mal desenvolvido e
humanamente oscilante, visto que traz cenas muito boas, cheias de empatia
sensorial e sensibilidade, mas que acabam isoladas dentro de um desenvolvimento
mal conduzido.

REFERÊNCIAS

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