

SINOPSE: Durante a Guerra Fria entre a Polônia
stalinista e a Paris boêmia dos anos 50, um músico amante da liberdade e uma
jovem cantora com histórias e temperamentos completamente diferentes vivem um
amor impossível.
O amor não se
define; o amor apenas existe e se vive. Com essa definição, assumidamente
pretensiosa até certo ponto, talvez se faça jus àquilo que o diretor polonês Pawel
Pawlikowski quis trazer ao público, ao filmar sua mais recente
obra-prima, “Guerra Fria” - uma ode às
histórias de amor que sobrevivem a todos e a tudo, inclusive ao tempo.
Indicado em três categorias para o Oscar 2019 – Melhor Filme Internacional, Melhor Fotografia e Melhor Direção -, “Guerra Fria” se passa na Europa do pós-guerra, no período de 1949 a 1964, tendo como pano de fundo narrativo o contexto histórico marcado pelos conflitos ideológicos de então, particularmente o vivenciado por quem se encontrava no lado comunista da Cortina de Ferro. Todavia, ao contrário do que as pessoas mais desavisadas poderiam intuir, o filme recorre ao termo guerra fria como título, apenas com o intuito de evidenciar a peculiar natureza conflituosa de encontros e desencontros, tensões e distensões do relacionamento entre Zula (Joanna Kulig) e Wiktor (Tomasz Kot).
Evidentemente, a
fotografia em preto e branco, de contrastes fortes ao estilo barroco, que
acentuam tanto a carga dramática e subjetiva do filme quanto à intenção do
diretor em aproximar sua obra o máximo possível de uma perspectiva estilizada
da realidade, sem dúvida é o grande destaque técnico de Guerra Fria. Tais
nuances fotográficas também servem para conferir à narrativa em tela uma
atmosfera de melancolia, em estreita sintonia com o reviver de memórias
imperfeitas do passado, efeito este que é reforçado por Pawlikowski, graças
ao uso de elipses - ora breves, ora longas, entre os planos. Desse modo, ao público compete
a tarefa de preencher os vazios constituintes desses saltos no tempo e no
espaço, que, a bem da verdade, parecem simbolizar o próprio vazio existencial
decorrente da efemeridade de cada encontro do casal.
Interessante notar
como a música é transformada numa personagem com vida própria no filme,
servindo para cimentar e potencializar dramaticamente a trajetória desse relacionamento
atemporal. Do embalo da tradicional canção folk
que resiste nos grotões rurais da Polônia ao cosmopolitismo cultural de Paris, as
vivências e os sentimentos circunstanciais dos personagens são expressos de
maneira intensa por meio da trilha sonora, sempre pronta a reafirmar que aquele
amor, a despeito dos entraves externos para sua continuidade concreta, haveria
de perdurar independentemente de ambos se manterem juntos fisicamente – algo que possui um significado impactante face
ao final de inspiração shakespeariana da película.

Por fim, é
impossível não destacar também a entrega e a autenticidade na atuação da dupla Joanna
Kulig e Tomasz Kot, que juntos tornam críveis, em cada semblante
e em cada movimento de seus corpos, a força do romance vivido por seus
personagens, que nem mesmo uma explosão nuclear conseguiria se igualar em
termos dos impactos reais gerados por toda uma vida.
A guerra fria dos
tempos de embate entre os polos capitalista e comunista é coisa do passado. “Guerra Fria”, de Pawel Pawlikowski,
porém, é a arte do fazer cinematográfico revelada de modo pujante e sensível, sabedora
de que a forma e o conteúdo são facetas complementares que, se reunidas num
amálgama perfeito, têm o poder de proporcionar obras-primas inesquecíveis para
a humanidade.
0 comentários: